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Zeca Camargo, um novato no Carnaval de Salvador – 01/03/2023 – Zeca Camargo

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Eu ia ortografar sobre todas as coisas incríveis que experimentei na minha estreia no Carnaval de Salvador. Mas aí eu vi o Ilê passar e…

Ia primeiro explicar que apesar de já ter visitado inúmeras vezes a capital baiana, eu nunca tinha tido a chance de passar os cinco (ou seis ou sete?) dias de Carnaval na cidade.

Ia justificar dizendo que por mais de 20 anos eu trabalhei nos fins de semana no Rio e por isso lá sempre foi minha escolha para me divertir na sarau mais popular do Brasil. E ampliar que, quando não tinha mais esse trabalho, veio um negocinho plano chamado pandemia, que atrasou meus planos de um Carnaval soteropolitano.


Ia descrever as longas e intensas noites de cobertura do rotação Barra-Ondina, nas quais eu tive o privilégio de conversar face a face com os maiores nome da música baiana e outros grandes destaques do pop brasílio, de Ivete a Brown, de Anitta a Pabllo, ancorando um grande evento televisivo chamado “Band Folia”.

Ia detalhar alguns desses momentos mais especiais, começando pela noite em que eu ganhei um grudar, atirado do soalho por um Rebento de Gandhy que desfilava lá embaixo jogando alfazema para o cumeeira e perfumando o mais suado dos foliões. E ainda ia expor que esse presente me fez chorar.

Ia lembrar que esse não foi o primeiro pranto da temporada, que uma noite antes, um percussionista do Olodum, depois de inacreditáveis peripécias com seu tambor de cabeça para grave, me atirou sua baqueta, um vasqueiro presente que já está sobre a porta da minha morada.

Ia rir da experiência surreal de passar a povaléu compacta que cercava o sege de Léo Santana (e o de Ivete!) para entregar prêmios para esses artistas e, tendo sobrevivido a isso, circundar aturdido pelo labirinto claustrofóbico e vibrante de um trio elétrico.


Ia resgatar um vasqueiro momento de serenidade durante uma entrevista com Gilberto Gil, no generoso almoço que ele e Flora oferecem no sábado de Carnaval, oriente ano celebrando o retorno do torrinha Expresso 2222 ao seu endereço original, o icônico prédio Oceania, no farol da Barra.

Ia retornar à folia descrevendo o choque de ver as três musas do É o Tchan, Carla Perez, Scheila Roble e Sheila Mello, dançando “Segure o Tchan” juntas sob o comando de Xanddy pra comemorar os 30 anos da margem e levando quem estava assistindo à loucura, inclusive eu.


Ia somar a essa memória, a de Armandinho, esse, o de Dodô e Osmar, me agraciando com uma versão muito carnavalesca (com tempero baiano) de “Love of My Life”, do Queen, fazendo o que talvez fique na minha cabeça porquê a segunda melhor versão da música depois daquela clássica do show da margem em São Paulo em 1981 —sim, eu logo estava lá para ver.

Ia compartilhar outras descobertas sonoras, porquê o Bailinho de Quinta, que merece uma dimensão mais pátrio; e redescobertas, porquê Tomate, que eu já tinha esquecido porquê sempre foi bom.

Ia desdobrar meu observação sobre tempero baiano para as suntuosas experiências gastronômicas dessa temporada contando com requintes as maravilhas que comi, desde o restaurante do hotel onde fiquei, o Quina, à tradicional moqueca impecável da Moradia de Tereza, passando pela simplicidade do acarajé da Dinha, que, para a minha perdição, ficava na esquina de onde me hospedei.

Mas eu resolvi deixar tudo isso de lado para falar da emoção que foi ver, lembrando, pela primeira vez, o Ilê transpor na ladeira do Curuzu levando sua infinita mensagem de sossego conduzida por uma divindade, oriente ano de 2023, chamada Dalila.

E aí eu fiquei sem palavras.


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