Entrei em pânico quando, no início da semana, recebi o relatório de tempo de uso de internet no celular e vi que ele tinha minguado 41%. Justo enquanto eu passava o meu natalício em Paris! Uma vez que assim?
Eu deveria estar postando alucinadamente. Por fim, estava na minha cidade favorita, com 40 amigos e familiares queridos, celebrando meus 60 anos… Onde estavam meus stories, meus reels? O que estava acontecendo com meu feed?
Tive de recorrer portanto à minha memória, nem sempre confiável, para reconstituir a semana de sarau. E o que eu me lembrei mais ou menos foi isto:
Um campo de flores no Le Doyenné, meus amigos espalhados nele uma vez que se fossem presentes da própria natureza.
Azulejos com imagens de palhaços do primeiro jantar no Clown Bar.
O peixe que comemos lá.
No Bouche, um merengue com um vela, “Parabéns a você” em francesismo, e eu assoprando a surpresa que não era para mim, mas para o Claude, que faz natalício um dia depois de mim.
A Notre Dame aparecendo num firmamento indecentemente azul depois de cruzarmos uma ponte navegando no rio Sena.
Um sorvete de óleo de oliva, receita de Alain Ducasse, na rua de La Roquette.
Camila tocando Martinho da Vila para a gente dançar num cabaré em Pigalle, Madame Arthur.
Charly Voodoo ao piano, na harpa e no theremin, no palco do mesmo cabaré.
Betty e Silvia e André e eu dançando juntos, de novo, finalmente.
Paula e Rafael chegando de surpresa de Londres para a sarau do dia 8.
Dezenas de garrafas gelando na sacada do apartamento onde fico esperando os convidados chegarem.
Um grafite do artista Jordane Saget se materializando enquanto comíamos o melhor frango assado da cidade no Brutos.
Thesée, o cachorro leonberger de quatro meses do David, roubando todas as cenas quando aparecia.
Os olhares perdidos num esplendoroso dia de sol sem saber para onde olhavam num roof toop que se abria para a Torre Eiffel, o Grand Palais, Montmartre, 360º…
As saladas que a chef Alessandra Montagne Gomes fez para a gente nesse dia.
As mesas de pingue-pongue flutuando no palco da Ópera da Bastilha, no último ato de “Nixon in China”.
As pessoas gritando depois de provarem a sublimidade da bochecha de porco do Les Enfants Rouges.
O desespero no rosto de Daï Shinozuka, o chef de lá, quando chegava mais um convidado para o almoço.
O amplexo da Eugenia, da Clarisse, do meu irmão Eduardo, o sorriso da minha mãe e o do meu sobrinho de oito meses.
O Denis sendo aplaudido cingido de carinho por ter encarado a tarefa hercúlea de organizar tudo isso.
As pessoas se virando para notar a formosura do Gabriel andando pelas ruas do Marais.
Astrid e Fausto olhando orgulhoso para ele.
“Rapture”, de Blondie, tocando no último volume na exposição sobre Jean-Michel Basquiat e a música na Filarmônica de Paris.
Luciana, Ana, Sossô, Renata, Nunuca, Carolina, Marina, Gustavo, eu, Alexandre, Tony e Herbert enfileirados para uma foto na dramática frente da própria Filarmônica, criada por Jean Nouvel.
O segurança do lugar dando bronca na gente achando que se tratava de um experimento de voga!
Robert Gober na coleção Pinault.
A Ana (outra!) se deliciando com a tapenade de azeitonas com figo da feira da avenida Richard Lenoir.
Marina e Camila caminhando com copos e garrafas no cais de La Tournelle.
Li também com um copo na porta do Chez Paul.
Maria Fernanda chegando com o melhor perfume do mundo de presente e o Petrit com uma caixa de biscoitos fingindo que era delivery.
Eu no fundo do paquete olhando essa gente maravilhosa feliz.
E por que eu não estava postando tudo isso? Porque eu estava vivendo.
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