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Uma caminhada por São Paulo durante a volta para casa – 23/08/2023 – Josimar Melo

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Já escrevi cá uma vez que paladar de caminhar pelas cidades, assim uma vez que escritores franceses louvaram seu paladar por “se balader (passear) à Paris”. Mas, no meu caso, é mais “caminhar” do que “passear”, um pouco dissemelhante.

Certas cidades nos convidam a caminhar sorvendo a paisagem, urbana ou humana. Caminhar sem orientação. O que não é muito meu caso em São Paulo.

Em Paris consigo me ver andando por caminhar. Em Istambul, passeando em ruas antigas ou à extremo do Bósforo. No Rio de Janeiro, perdendo-me (uma vez que se isso fosse verosímil) pela orla.

Mas mesmo nesses casos sou assaltado por uma certa veia da imobilidade. Enfim, sou um compulsivo procrastinador (termo que ficou na tendência, quem diria: quase impronunciável, terrível trava-língua, eu a colocaria na tendência só no ano que vem, sempre). Por que levantar e transpor andando sem razão?

Por outro lado, paladar muito de caminhar. Não sobre uma esteira, sem transpor do lugar, uma vez que um hamster desnorteado; mas nas ruas –desde que com um objetivo em mente. Um estranho pragmatismo.

Num aeroporto, sujeito-me a caminhar quilômetros: me aprazente ver pessoas diferentes que se misturam, ouvir línguas que se sobrepõem e até olhar uma ou outra loja, onde nunca compro zero. Não acho estranha essa marcha, porque estou saindo de um avião e indo para outro, uma vez que necessário.

Ao contrário, me dá preguiça transpor de lar para caminhar quilômetros sem ter aonde ir, unicamente rodando uma pista no parque uma vez que um peru bêbado antes da irrespondível ceia de Natal. Se preciso de um chip de celular, porém, não me incomodo de caminhar meia hora até uma loja no shopping horroroso. Nem de voltar a pé –pois sei aonde, e porque, estou indo.

E nunca me arrependo. Ao caminhar, mesmo por trechos feios da cidade, um pouco vou fruindo. Lojinhas insuspeitas, malucos surpreendentes, árvores frutíferas de onde colho pitanga ou amora (também me ocorre, acredite, desviar de projéteis perigosos dos altos abacateiros, ou pesadas jacas que, desabando uma vez que asteroides, podem não exterminar os dinossauros, mas não poupariam leste passante jurássico).

Estive há pouco em São Paulo, num desses destinos que não desejamos a ninguém (posto do Detran num Poupatempo —zero resolvido, aliás); mas, voltando a pé, resolvi cruzar o parque Ibirapuera, que nunca visito para passar (fiz isso no pretérito; peru perde). Cumpria uma missão corriqueira e legítima –voltar para lar, derrotado pela burocracia— e aproveitaria para visitar o Museu de Arte Moderna, que tem sido meu principal ímã para visitar o parque.

Mirei no caminho o obelisco do Ibirapuera, construído cá mesmo, pensando na Agulha de Cleópatra, em Londres (que, com seus 3.500 anos, deveria por recta estar à extremo do Nilo, não do Tâmisa), e lembrando que o poeta Paul Verlaine, ao “se balader à Paris”, desviava de seu caminho (uma vez que outros contemporâneos seus) para não ter que encarar outro cimo monumento, a torre Eiffel, horroroso “esqueleto de campanário”.

Saindo do ficção, segui para ver a instalação de Tunga que ocupou o espaço do museu onde ficava a aranha de Louise Bourgeois: valeu cada centímetro, além do mistério de aspirar um fragrância de canela que descobri ser de âmbar, veja só. Ainda parei para um vinho e um almoço no Prêt MAM, um decente restaurante de bufê com vista envidraçada para o jardim de esculturas.

O medidor de atividades físicas do meu celular, que vive livre, desta vez me avisou feliz da vida que eu tinha cometido 8.000 passadas, quase seis quilômetros, entre o Poupatempo e o meu sofá. Não me censurou por ter parado para tomar no caminho. Acho que ele já me conhece.


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