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Em Paris, fingindo-me parisiense e comendo à francesa – 20/09/2023 – Josimar Melo

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Não ia a Paris desde antes da pandemia. Agora que a oportunidade surgiu, dá pra imaginar a quantidade de museus, pessoas, cafés e novos restaurantes acumulados na agenda para visitar.

Mas não foi verosímil transpor ticando a lista de desejos. Foi uma viagem breve, de cinco noites, e com uma agenda alucinada de gravações para os canais Sabor&Arte e Band, focadas não em restaurantes ou museus, mas em queijos.

Com o agravante de que, com equipamento para carregar, não dava para usar transporte público, tampouco as bicicletas. E com os engarrafamentos, os momentos livres se tornaram ainda mais escassos.

Boa oportunidade, logo, para fingir-se de parisiense. E, no tempo disponível, manducar no café da esquina pratos típicos e cotidianos de quem vive lá e preza a boa mesa.

Houve exclusivamente uma excentricidade: no dia em que cheguei, troquei o jet lag por longas horas em um grande restaurante, o do hotel Plaza Athénée, que estava curioso para visitar desde que, com a saída de Alain Ducasse, o comando passou para um chef mais jovem, pop e midiático, Jean Imbert.

Mas, mesmo ali, no lugar de uma culinária vanguardista, encontrei ecos de uma cozinha de tradição, baseada em clássicos antigos de Paris. Foram pratos uma vez que a lagosta à parisiense, sobre ligeiro emulsão; o brioche enroupado por caviar; e o ris de veau (timo de vitelo) financière, em tamanho folhada. Tudo servido com a precisão típica do sítio, onde pontificam, dos tempos de Ducasse, o elegante diretor de sala Denis Courtiade e o entusiasmado sommelier Laurent Roucayrol.

Onde reencontrei o ris de veau (que os argentinos chamam de molleja) foi no moca da vizinhança, meu principal tramontana gastronômico da breve temporada: o La Petite Périgourdine, colado ao hotel. O nome significa a mocinha do Périgord, região famosa pelo foie gras, terrines e trufas, mas não só.

Foi onde me aboletei em primeiro lugar, direto do avião, cansado, esperando que o quarto do hotel fosse liberado. Abatidos e entediados, fomos sentar na mesinha da lajedo; e não demorou para que me aproveitasse da fadiga distraída (e do efeito das primeiras cervejas) para convencer meus colegas de equipe a provar as tentações do cardápio.

Para quem nunca provou, pareciam assustadoras. Primeiro uma andouillete artesanal —com uma fresca saladinha e batatas fritas— intensa, mas domada, realçada pela fritura. Ótima para um prato de 24 euros (em um lugar mais arrumadinho seria o duplo).

Não escondi que era uma linguiça de tripa de porco: ninguém desmaiou. Entusiasmado pela paciência dos colegas, pedi logo rins de vitelo. Que vieram na panelinha, o molho flambado com conhaque ali mesmo na lajedo —uma formosura carnuda e macia, com sabor intenso arredondado pelo molho cremoso. Expliquei que, se a andouillete não cheirava a excremento nem o rim a urina, o lugar já era sério só por isso.

Foi onde também comi um frágil fígado de vitelo, cheiroso e macio, escoltado pelo aligot (purê de batata e queijo) servido diretamente da panela.

Cansado dos intensos dias de trabalho, enfastiado depois de tanto queijo, uma noite resolvi caminhar pelas redondezas do hotel, na região da Sorbonne. Passando em frente ao sempre lotado Le Comptoir du Relais, recentemente vendido, encontrei amigos e ali me instalei para uma singela taça de vinho.

Nela fiquei —até surgir o prato que haviam pedido: pé de porco recheado e empanado. Simples que não resisti, e imediatamente tinha diante de mim outro réplica. Não que estivesse com míngua: mas vai saber quando estarei em Paris outra vez?


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