Que tipo de turista você é, raiz ou Nutella? O primeiro tende a abraçar experiências mais cruas para extrair um gostinho sítio da “vida uma vez que ela é”. Para o segundo, digamos que saber outras culturas é lindo, mas se for para passar muito perrengue, melhor nem transpor de vivenda.
Sinceramente, não há mal qualquer em entender qual o seu estado de espírito para as férias. Uma viagem por Mato Grosso do Sul pode, inclusive, mostrar as vantagens em combinar o melhor dos dois mundos.
A primeira paragem é Bonito, com atrações turísticas que fazem jus ao nome da cidade. O Zagaia Repercussão Resort, onde a reportagem ficou hospedada, é uma daquelas opções de estadia que comportam de tudo: famílias com moçoilo, excursão de velhinhos, casais apaixonados e despedidas de solteiro, às vezes todo mundo junto e misturado na mesma piscina aquecida indoor, bebendo seus Toddynhos ou caipirinhas.
O multíplice tem ainda playground aquático e piscina com borda infinita, queridinha das selfies com pôr do sul ao fundo, mais onipresentes que chaveiro de arara em lojinha da região.
Há quartos em que só o banheiro é maior do que muito studio para alugar em São Paulo. A depender, simples, do quanto se está disposto a desembolsar. Cinco diárias para dois adultos podem superar os R$ 10 milénio, valor que as rapaduras de cortesia muito que tentam adoçar. Mas que a sinfonia de passarinhos na janela pela manhã ajuda, isso ajuda.
Dá para passar o dia no hotel, que oferece versões light do turismo ecológico, uma vez que trilhas, árvores carregadas de amora e pescaria no estilo pegue-e-solte. Para isso se aluga por R$ 30 uma vara de pescar que, na internet, compra-se por menos que isso. Tudo muito, ser turista tem dessas.
Outros luxos pagos à segmento são as massagens do spa. Elas podem ser combinadas com banho de ofurô, calibrado com mel, sais, espuma, leite ou óleos essenciais. Oitenta minutos tudo, por R$ 440.
Não que as alternativas de passeio na dimensão deixem a agenda livre. O Buraco das Araras é uma delas. Trata-se de uma depressão com 500 metros de periferia e 100 metros de profundidade, formada em seguida o colapso do teto de uma caverna milhares de anos detrás.
Araras usam as fendas da encosta para montar ninhos e se reproduzir, um mix de maternidade e motel. Uma vez que muitas aves, só têm um par pela vida toda, embora na tarde em questão a reportagem tenha testemunhado um trio não monogâmico ziguezagueando pelo firmamento.
O guia conta que no pretérito, sem qualquer regulamentação ambiental, o sítio era usado para atividades zero lícitas. O pessoal ia dar tiros por esporte, improvisar lixões e até desovar cadáveres. A carcaça de um sege Brasília que despencou (ou foi despencado) décadas detrás continua lá, escondido pela vegetação.
Outro buraco para se meter é o Barranco Anhumas, uma das incursões mais caras da região. São R$ 1.350 para fazer flutuação (flutuar de colete salva-vidas e snorkel) e R$ 1.800 para os adeptos do mergulho.
É uma proeza com mordomias: não faz muito tempo, quem quisesse chegar ao interno da caverna, até se deparar com um lago cristalino, precisava dominar o rapel. Agora, não. Uma cadeirinha elétrica desce a pessoa por quase 80 metros, o que é desaconselhado para grávidas (as cordas podem apoucar a bojo), crianças pequenas e fóbicos de profundeza.
Embaixo há um deque com banheiro e trocador, onde se veste um macacão de neoprene mais justo que muito modelito da Kim Kardashian. Guerreiros são os que dispensam a roupa de borracha, contraveneno térmico contra uma chuva com temperatura média de 18°C.
Há opções mais amigáveis ao público infantil, uma vez que a flutuação por rios translúcidos, onde em julho turistas avistaram uma serpente sucuri de quase sete metros.
Outra: o Bio Park, uma versão mais politicamente correta dos zoológicos. Os animais ali precisam de cuidados e estão inaptos a viver na natureza selvagem. Uma das proprietárias, a zootecnista Ada da Cunha explica no tour sobre a origem de alguns moradores, uma vez que a lobo-guará Flor, que perdeu toda a família atropelada por um trator, e o tamanduá Chiquinho, resgatado ainda com cordão umbilical.
Roteirizar os passeios com ajuda de uma escritório faz diferença cá, onde nem tudo é perto, e há muita estradinha de terreno no caminho. “Bonito é um sorte incomparável e múltiplo, daí a relevância de otimizar tempo e poder aproveitar as mais de 40 maravilhas locais”, diz Marco Antonio Tiago, da M26 Assessoria de Viagens.
A rota gastronômica bonitense inclui dois restaurantes badalados. O Juanita começou com uma chef que administrava um self service, até o rebento transformá-lo num daqueles empreendimentos que cobram dezenas ou centenas de reais pelo prato. Não faria mal-parecido na paulistana Vila Madalena.
O pacu na brasa é um dos favoritos. Para a ingressão, sugestões uma vez que músculos de jacaré na manteiga. De sobremesa, petit gateau com sorvete de jaracatiá, fruta regional que lembra o coco.
Na Morada do João, com uma parede superpovoada por fotos de famosos uma vez que Alcione e Fábio Porchat, duas boas pedidas são o pintado com urucum e o ceviche de banana da terreno.
A quatro horas de sege fica a segunda perna da viagem, no Pantanal Jungle Lodge, hotel em Corumbá (MS), mas longínquo de maior infraestrutura urbana. É uma experiência mais rústica, ainda que tenha lá seus confortos, uma vez que ar-condicionado nos quartos.
Sem restaurantes badalados por perto, faz o estilo pensão completa, com todas as refeições incluídas na diária de R$ 780 para um par. Comidinha honesta e saborosa —no primeiro dia, o almoço foi costela de pacu frita, arroz, feijoeiro, farofa, bife acebolado, jerimum e salada, mais guloseima de figo para arrematar.
Sempre acompanhadas por um guia, que de manhã oferece o cardápio do dia, as atrações também são contempladas na diária. Vai de cada um determinar o proporção de proeza que quer encarar.
A pescaria é feita na margem do rio Miranda, em frente ao hotel, entre capivaras e tuiuius (a ave-símbolo do Pantanal, de pescoço vermelho e ponta preto) que correm solto pelo gramado.
Mais intrépidos são os que acampam uma noite no meio do mato. Um risco alguma coisa controlado, simples, mas sempre sujeito a contingências. Caso de duas hóspedes que foram pegas de surpresa, em setembro, por uma tempestade daquelas. Mas só se alarmaram, segundo o guia que as acompanhava, quando uma delas acordou sobressaltada por um pesadelo. Tinha sonhado que um jacaré invadia a barraca.
A população pantaneira desses répteis fica em torno de três milhões. Tem muitos deles no rio onde zanzam barcos e caiaques do hotel, em trajetos que podem ir noite adentro.
É quando escurece que fica mais fácil de ver onça nas margens, embora o evento seja muito esporádico. Tentar descobrir uma lembra aquela antiga pândega do Fusca azul, quando você dava um soquinho na pessoa ao lado se passasse na rua um sege desse padrão e cor.
A reportagem não avistou uma onça que fosse, mas se deparou com um firmamento estrelado que deixa qualquer pintura de Van Gogh no chinelo. E viu também muitos pássaros, uma vez que o joão-grande, traduzido pelo guia turístico uma vez que “big John” para os vários estrangeiros na embarcação.