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O fim da era Starbucks – 03/11/2023 – Cozinha Bruta

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A Starbucks não vende moca: vende cultura americana.

Assim, surpreende pouco a quebra dos operadores brasileiros da rede. Eles culparam a pandemia e o abstrato “dispêndio Brasil”. Não lhes ocorreu a hipótese da própria incompetência, tampouco a perda de relevância da marca.

Temos uma cultura robusta de moca (trocadilho premeditado) há 200 anos. A Starbucks nos oferece café-com-leite, literal e metafórico –alguma coisa fraco, sem competitividade.

A rede fundada em Seattle teve valia fundamental na pregação do evangelho cafeeiro. Mudou hábitos e ensinou rudimentos do moca para milhões de pessoas em vários países, Brasil incluso.

Quando a Starbucks começou a se expandir, em 1987, o moca que se tomava nos Estados Unidos passava o dia todo num bule de vidro aquecido. Coisa rala, clarinha, feita com grãos inferiores e torrados até virar carvão.

Esse ainda é o moca padrão dos americanos, tão ruim que o servem de perdão nas lanchonetes de extremo de estrada. A Starbucks conquistou o consumidor urbano com grãos melhores e uma abordagem pretensamente cosmopolita.

Passei alguns meses na Califórnia em 1992. Naquela quadra, tanto lá quanto cá, a Itália invadia de forma inédita os supermercados: macarrão de trigo duro, tomate enlatado, vinagre balsâmico, azeites e conservas fascinavam consumidores acostumados com a porcaria lugar.

Era bacana se comportar uma vez que um italiano, do ponto de vista estritamente cevar. Ingerir moca é fundamental nessa rotina.

Em Berkeley, perto de São Francisco, havia (e ainda há) um lugar chamado Caffè Strada. O estafe de estudantes italianos servia aos gringos o trivial de seu país: expresso, cappuccino, caffè macchiato etc.

Já se notava um proporção de miscigenação. O Strada vendia, por exemplo, um evidente espresso doppio: expresso duplo, uma xícara de chá repleta de moca poderoso, alguma coisa impensável na Itália.

Representante sumo da mesma tendência, a Starbucks mestiçou a cultura italiana do moca com a preocupação dos americanos por bebidas doces em copos gigantescos de papel oleado.

Compre meio litro de frappuccino com avelã, baunilha, caramelo qualquer coisa que máscara o paladar do moca. Pegue esse balde de leite aromatizado e beba no carruagem, enquanto resolve pepinos do escritório no congestionamento. It’s the American way.

Quando a Starbucks chegou ao Brasil, em 2006, ninguém sabia de arábica, torra média, bourbon amarelo, microlote, hario ou prensa francesa. Predominava o expresso torrado e mal tirado.

Também cá, a Starbucks subiu o sarrafo médio do moca. E fez sucesso graças à jequice insanável do brasílico, enamorado por franquias americanas. Sucede que paixões são volúveis por natureza.

O moca melhorou demais no Brasil, mas a Starbucks não acompanhou.

O que selou o declínio da operação brasileira, porém, foi a internet fácil em qualquer lugar. As lojas da Starbucks servem cultura americana e wi-fi, combo que perdeu o clarão e o borogodó.

Temos 4G e 5G. Temos pão de queijo mineiro e bolo de fubá. Temos cafezinho gostoso pretérito na hora. Não precisamos mais do café-com-leite da Starbucks.


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